E eis que acabou o sonho. Meu sonho de adolescência. Para muitos, um sonho besta. Mas era o meu sonho e não era nada besta. Era aquele em que eu dizia ‘depois dele, não vou querer mais nada na vida’. Realizei e tentei permanecer nessa realidade dia após dia: alimentar o sonho com mais sonho, com mais fé, com mais esforços.
“Como vai seu sonho?”, me perguntavam o tempo inteiro. E eu dizia, com todo o meu orgulho de tê-lo realizado: “vai bem. Olhem para ele. Posso tocá-lo!”. No fundo, talvez, eu quisesse dizer: “Experimentem tocar em seus sonhos também. É impressionante”.
Os dias passaram e acordei do sonho: a fé tinha se dissipado e os esforços só permaneciam graças ao fato de não ter ouvido minha mãe, quando criança, que me dizia: deixe de teimosia, menina! Ele se alimentava graças à minha teimosia em não reconhecer a mim mesma que não havia mais sonho, ali. Só uma ilusão infértil. Não havia mais por onde ir. Não havia mais frutos. Mas ser teimosa cansa quando você descobre que isso é tudo o que restou e que é tudo o que te impulsiona a levar a coisa adiante.
Joguei meu sonho para o alto de uma vez, no supetão, para não olhar para ele de novo me apelando: “Ei, eu sou seu sonho. Seu grande sonho. O que você vai ter depois de mim?”. Eu ia pagar para ver.
Paguei e não vi nada.
Aliás, corrijo-me, eu vi exatamente aquilo que temia: o nada. Um vazio puro. Sem cor, sem substância, sem transparência. Sem formas, sem qualquer forma de descrevê-lo. Não havia mais nada na minha vida, fora eu.
Embora pareça que esteja diminuindo a mim mesma, juro que não é isso. É que meu sonho era maior do que eu supunha que eu era. Lembrei-me até da charada do impossível: Se Deus pode fazer tudo, pode criar algo que não consiga destruir. Mas se Deus pode fazer tudo, como não poderia destruir esse algo?”.
Quem é maior? Meu sonho ou eu? Eu ou meu sonho? Meu sonho que se destruiu na rotina e nos problemas reais? Eu que o destruí com meus destrambelhos, minhas ansiedades, meu despreparo? Seja como for, ele se foi e eu continuei. Acreditem: É muito difícil continuar sem a grandiosidade de um sonho. Continuar sozinha. Com todos ao seu redor dizendo: “crie novas perspectivas, crie novas perspectivas. Não iria dar certo mesmo. Não pare para chorar”.
Fiz mais ou menos como disseram: Não parei, mas chorei, quase sempre um tanto às escondidas...Chorei por meu sonho besta.
Só que comecei a ter orgulho da tristeza e deixei de ver algo a mais do que essa sensação de nada: um alívio. Alívio de cair na real. Eu vivia dizendo que não tinha que provar nada a ninguém, mas esqueci que também não tinha que provar nada a mim mesma, e tentava provar a qualquer custo. Mas não era só isso. A sensação de alívio também vinha de uma descoberta que, à primeira vista, seria um tanto amarga: nada como não ter nada a perder! Nada a almejar também. Continuar só por continuar.
Eu sei que isso é só fase. Já já encontro um grande – talvez não tanto, mas mais ou menos grande – sonho pelo caminho, mas não posso negar que estou sentindo uma liberdade em não desejar. Não fazer questão, não ter que fazer, não ter que querer, não ter. não se afetar: faz tempo que isso não me ocorre.
Talvez nem demore muito tempo, por isso estou aproveitando cada segundo dessa sensação: fazer por fazer, sem me cobrar, a mim ou a ninguém. Não esperar nada. Eu sempre pensei que isso fosse litetatura de araque, auto-ajuda de segunda. Mas é sério: isso existe. É uma tristeza leve. O alívio de estar triste. O alivio de viver apenas de fatos.