segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

a quem a gente deve esse ser-estar feliz?


a quem a gente deve esse ser-estar feliz?
saber onde está e o que quer fazer
agora mesmo
agora mesmo tem uma mochila amarrotada de papéis para organizar
o ônibus e o pneu furado.
agora mesmo a gente tem que ter um trabalho para sobreviver
e a gente é necessário aqui e ali, com nossos amigos
olho ao redor e ninguém está feliz por trás do espetáculo
são só paisagens, caras cortadas, cantorias espaçadas
e interrompidas após o clique.
e tantas tantas coisas a dever
e esse bendito grande dever de ser-estar feliz
por mais incoerente que seja com a realidade.
é um tal de dever saber onde está,
por mais que esses lugares nos sejam sempre transições
e o que a gente quer fazer
o que se pode fazer
além de reunir todas as forças para jogar os papéis velhos acumulados na mochila?
e entrar em um ônibus que vai nos levar a só mais um lugar em transição

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Lúcia

que a gente não esqueça quem a gente é
que esse choro cor de sangue não deixe de nos invadir

que não nos esqueçamos da conversa corriqueira
do fim do corredor, do lixeiro, de uma cadeira
azul e um tanto quebrada

e ela sentada,
com seu riso solto,
o café resgatado
e o salário descontado.

"- como vai o pequeno?
- crescendo, crescendo. vai à lua, do jeito que vai."
entro na sala de aula. ela sai..

vamos sociologizar sobre cães e peixes espadas
vamos relativizar a violência
nada de debates, fiquem mudos!
e foquem vossa impaciência
no que interessa para o mundo:
a produtividade da (neutra) ciência

vamos passar direto, olhando para frente ou para cima
e se vier a sensação de atropelo
não se distraia olhando para os lados
a resposta está nos prazos
porque tempo, vos digo:
é dinheiro.

Saímos das aulas com corpos esmagados
olhos cansados, passos atarantados,


"E não esqueçam, meus caros
A pressa é melhor amiga da produção
falem sobre cadeiras, chaves de fenda ou papelão
afinal tudo é digno da nossa sociologização


Só não olhem para os lados.
não há murais informativos,
só pessoas"

E agora a cadeira está vazia
o corredor não tem gargalhada
e enquanto a sociedade mata
a gente escreve sobre o caixão

"mas as coisas findas, 
muito mais que lindas,
essas ficarão"


des-ontologia

minha gaveta tá toda bagunçada
deixei ela desarrumada por não ter olhado antes
enquanto catava qualquer veste que dava
para não perder tempo, para voltar a atenção ao que era certo olhar
para o que precisava atentar

um mundo inteiro e muitas dores, brechas, sacanagens
cortes cirúrgicos, quedas, tratores, pontos para reparo 
poucos braços e muitos olhares enviesados
tanta correria, 
do que me importava o que tirar do armário?

pior que continuo pensando exatamente igual

que merda não poder olhar para o que acho certo olhar
porque agora minha vida - que nem tem lá esses problemas todos - está bagunçada demais para que eu consiga resolver qualquer outra coisa,

eu tenho que arrumar essas gavetas todas
finalmente vestir uma armadura certa
e encontrar as armas certeiras
para reunir-me de volta onde preciso estar. 


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