domingo, 23 de junho de 2013

de mãos dadas

Fernandes Lima no início do protesto em Maceió 20.06

Agora levanta a mão quem acreditava que, se um dia o carnavalesco e futebolístico país decidisse se aglomerar diante de motivações políticas, o rompante seria uníssono.
Se todos teriam as mesmas reclamações. As mesmas opiniões. Vestiriam a mesma camisa. Teriam as mesmas ações, a mesma agressividade ou passividade.
Teriam, no mínimo, a mesma noção de localização, de espaço, de história?
Saberiam todos contra quem ou pelo quê estariam marchando e gritando rimas de ordem?

Duvido muito que alguém tenha levantado a mão e, daqui do outro lado, quase posso ver aquele olhar de "mas é claro que não, mas..."

Tem muita gente criticando o que tenho escrito pelo facebook. Achando irracionalmente otimista, para não dizer o mínimo.
São pessoas que começaram animadas com a mobilização e, ao verem emergir todos os problemas de senso comum e daquela superficialidade passível de ser manipulada,
optaram por se revoltar contra 'A Revolta', ironizar e avacalhar tudo o que acontece e, desiludidas e ofendidas, se afastar da multidão que agora reclama.
"Não basta ir às ruas. É preciso ter direcionamento do que se quer reivindicar", dizem. E estão corretos.
Mas estão, no mínimo, precipitados, ao acreditar que essa multiplicidade de pautas significa a derrocada.

Prefiro pensar em começo. Prefiro pensar que faz parte. Prefiro pensar que, de fato, se um dia algo como um milhão de pessoas se manifestassem em todo o país, não poderia ter sido diferente. Poderia?

Porque, para começar, muitos ólogos se vivos estiverem, devem estar inquietos ao terem escrito que, com essa cultura consumista, virtual, televisionada, simplesmente seria improvável uma reunião tão grande de gente em espaço comum para dizer o que diziam individualmente, ou quase só pensavam: não estamos gostando de nada disso.
As desilusões políticas, que por tanto tempo geraram apatia e buscas por um bem estar imediato e invididual, quase que inesperadamente tomaram conta de quem antes sequer queria pensar ou acreditar em mudanças. O que antes só parecia correr por cabos USB se transformou em sangue que esquenta e inflama numa multidão em marcha.

O problema é que se trata exatamente disso: de uma multidão em marcha. Não mais aquelas poucas dezenas ou centenas de pessoas orientadas politicamente por movimentos específicos que fecham a Fernandes Lima, enquanto a multidão, ainda sozinha, assiste tudo e se limita a minimamente apoiar ou criminalizar.
Agora se trata de uma multidão que, desordenada-bagunçada-e-permeada-de-sensos-comuns - deixou a TV e foi às ruas, lidar com o que os partidos e movimentos e as periferias já lidavam dia a dia.
A multidão chegou assim, de pára-quedas,e não quis que esses partidos e movimentos - que sempre estiveram às ruas e nunca quiseram ou puderam relaxar ou descansar em berço esplêndido -  tirassem suas bandeiras e se juntassem unicamente enquanto 'povo'. A apatia política do 'povo', que não quer saber quem é mocinho ou bandido, se transformou em fúria desmedida, ignorante e elevada a níveis violentos, contra tudo o que lhes pudesse lembrar a organização política atual. A democracia que emana do povo se contradiz ao querer oprimir a liberdade de uma parcela desse mesmo povo que quer -e, graças à democracia - tem o direito de levantar suas bandeiras.

Certo. Agora sim encontramos um problema importante. O povo se volta contra o povo. A multidão se volta contra quem sempre quis pleitear os direitos dessa mesma multidão. E essas pessoas orientadas historicamente, que deixaram o senso comum e entendem essas nuances, desiludem-se, frustram-se, entristecem e... se abstêm. Caem fora.
Dentro das discussões nas redes sociais, começa a surgir mais e mais imagens do recém ''movimento dos sem partidos'', enquanto que começa a ficar cada vez mais rara a intervenção dos que compreendem o que está acontecendo. Sejam eles com ou sem partido.

E aí, esses mesmos 'mais entendidos' tiram sarro, avacalham e..se afastam. Não entram para a discussão. Não aproveitam esse instrumento e fenômeno tão improvável e fantástico -a multidão individual que enfim se reúne - para discutir os problemas que permeiam a cidade, para apresentar/reforçar/ insistir e dialogar as diferenças e incompreensões políticas que são tão, mas tão naturais. Não entram no embate, respondendo pessoa por pessoa, porque "é cansativo e talvez nem surta efeito".

E anos depois sonharão e lembrarão de como desejaram que as mentes do senso comum migrassem para um novo senso comum: o senso de comunidade. Mas chegou tão perto! - pensarão - ao lembrar do que pretendiam quando iniciou toda a 'erupção': melhorar as condições de vida - começando pelo transporte - dos brasileiros. 

Talvez a política só precise de um pouco de poesia, afinal,
de um pouco de Drummond pedindo aos taciturnos que voltem a se nutrir da grande esperança acendida há poucos dias. E por trás de seus óculos redondos, segurasse o megafone daqueles trios polêmicos, e anunciasse o que precisamos lembrar para continuar:

O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.



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