segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Ondas estranhas




Especialmente naquele dia ela acordou mais cedo do que deveria, madrugada. Andar na praia. "Quantas vezes lhe faltou a palavra, quantas vezes elas saíram mentirosas...Que minhas pernas nem queiram saber... Quantas vezes as palavras rasgaram seu coração e nem me deram o devido valor?" Ela estava sozinha naquela praia com palavras que lhe sufocavam e ironicamente, a libertavam. Distância imensa- ou talvez não- do mundo das palavras e do mundo que ela via e sentia naquele momento. Ela tocava com os pés a areia, ainda tentando descrever a sensação de deixar-se afundar nos grãos quentes e fofos. "Ainda me sinto dependente delas."

Foi andando em direção mar. "Estou chegando. Quantas palavras duras gritei gratuitamente? E quantas amorosas morreram na garganta? Quantas palavras inúteis, que mereciam ser afogadas, fragmentadas no mar imenso a minha frente. Que grande poder! E ainda são futilizadas, disperdiçadas..." Sentia seus pés na água gelada do mar. "E o sol que ainda não nasceu?" Sentia que a cada passo que dava para frente, um pedaço dela doía com a água cortante. "Palavras não lhe serviram para nada na maior parte do tempo, a não ser para exercer meu ofício e meu papel. As palavras fizeram com que eu esquecesse de quem era, me tornaram barulhenta, silenciaram minha alma, e que alma? Palavras agora onipotentes, deixaram o mundo doido e doído. Palavras destruíram nações e continuam causando estragos. Palavras manifestaram decisões mal pensadas, idéias mal inspiradas, pensamentos totalmente desgovernados.."

Pensamentos...distanciaram-na do presente. Fizera com que ela não reparasse nas flores do caminho, preocupada em conversar com seus botões incessantemente.

Então ela mergulhou com tudo. Choque pelo corpo todo. "Por que as palavras não iam embora de vez? Minha mente não se estabiliza". Ela não conseguia simplesmente curtir o momento sem que o turbilhão de palavras a enlouquecessem. Nesse momento teria respirado fundo, se a cabeça não estivesse submersa na água.

Ela levantou, nadou e assim não sentia mais dor nem choques. "As palavras também encantam. Lembro-me que as mesmas confortam um amigo angustiado. Lembro, agora lembro, dos poemas lindos e dotados de tamanha simplicidade que exaltam a Vida! Das declarações de Amor, das composições sublimes".

As coisas começaram a ficar claras, no céu e dentro dela, qual dos dois é o Paraíso? Ela nadava, já bem íntima com as temperaturas de dentro e de fora... saiu do mar e deitou na areia. O sol, enorme, nascia. Fez as pazes com as palavras, consolou as lutas internas. E assim passou a SENTIR seus segundos.

Silêncio agora!

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