Minha mãe conta que eu detestava ir à escola, porque só queriam me dar massinhas e eu não queria saber delas, apenas de livros...Ninguém entendia! Como já sabia ler a essa altura, a psicóloga e a assistente social disseram à minha mãe que me pusesse logo na primeira série, a alfabetização me desestimularia. E foi assim que jamais ganhei o anel do ABC...
Mas tudo bem! Da primeira série, no Santa Rosa, e da segunda série, no Marista, pouco me lembro. Foi lá no Sacramento, na sessão infanto-juvenil da biblioteca, que me fartei! Livros de romance, aventura, suspense... Poderia listar, sem parar para respirar, todas as estórias maravilhosas e escritores preferidos. Aqueles livros nunca me levaram a tirar 10 em nenhuma matéria...eu era a típica aluna nem lá, nem cá... No primeiro ano, eu era super sozinha, ninguém botava fé na caçulinha aqui... Com um tempo, acabei ganhando uns amiguinhos, mas também adorava passar o recreio deitada nas gigantescas almofadas da varanda da biblioteca.
Era tão bom ficar um pouco na pele daquelas personagens! Quantas vezes não chorei com os livros de José Mauro de Vasconcelos, caí na risada ou no “eita poxa” com Fernando Sabino, ou senti aquela angústia de ter terminado rápido demais um Harry Potter! Haviam aqueles livros do colégio, que éramos obrigados a ler. Alguns até gostava, lia logo quando minha mãe comprava os materiais! Um exemplo era Vida de Droga, Walcyr Carrasco.
Na minha infância, costumava jogar chimbra, garrafão e queimado com os amigos do meu irmão. Também brincava de Barbie e de escolinha com minha vizinha. Filmava programas de receita com amiga do colégio, cantava no caraoquê improvisado lá em casa... Meu sonho? ser uma chiquitita! Mas ainda assim, os livros estavam na minha cola. Eu estava na cola deles. Ô amor recíproco, esse!
Do meu grupinho de meninas, todas gostavam de ler. Éramos as ‘ratas’ da biblioteca. Aos 10 anos, minha tia me deu uns livros de literatura do tipo 'Volume Único' que me apresentaram Cecília Meireles, Fernando Pessoa, Mário Quintana, Manuel Bandeira, Carlos Drummond... Longe de pagode romântico, naqueles tempos de fossa, eu curtia a dor de cotovelo com Clarice Lispector...
Não havia obrigação. Nunca houve. Havia amor, em seu sentido máximo de envolvimento desinteressado. Imaginação, ao estar em todos os cantos que, fisicamente, seria complicado. Viagens não físicas, das quais jamais saí ilesa. Aos pouquinhos, entre aspas e reticiências, me tornei o que sou.
Dia desses, estava eu na Bienal do Livro com um amigo e, ao depararmos com uma coleção de literatura brasileira (com José de Alencar, Machado de Assis), ele soltou essa: ‘bem que esses livros devem ser bons, mas quer saber? Fiquei traumatizado com os tempos de colégio!”
Hoje em dia, os livros têm que ensinar alguma coisa, “dar bom dia ou dizer ‘obrigado’, seja um menino educado”. Os livros preferem trazer questionamento, ignorando a emoção e a imaginação. E o resultado? Nem um, nem o outro! Ninguém absorve algo que não o interessa ou o atrai! Tantas árvores são derrubadas por livros que passam batido. É de dar dó!
Para que seu filho goste de ler, ele tem que ser despertado para um mundo mágico, para um lugar que ele não conhece e para personagens interessantes. Pode até ensinar uma boa lição, mas o livro tem que ser uma extensão na vida e na cabeçinha da criançada! Educação é o modo em que as pessoas ao redor delas agem.
Mas ler,
ler mesmo...
tem que ter fascínio,
ou não haverá bom domínio!
*Baú de Espantos é o título de um livro de Mário Quintana
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